Gia volta à caatinga
onde Bia nasceu para tentar descobrir o seu paradeiro, mas apenas consegue
ouvir relatos sobre a infância dela, que foi criada pela tia, a
“bruxa-madrinha” mal humorada e rabugenta, com quem se mudou de Recife para São
Paulo. A narrativa de Bodum é a da busca de Gia pela amiga, sua viagem pelo
interior, que alarga seus olhos para a miséria da região, tervigersando por
temas nevrálgicos como a xenofobia sofrida pelo nordestino no sudeste e os
crimes contra os povos indígenas.
Ao procurar pela amiga, Gia procura também por ela mesma ao retornar igualmente ao seu sertão e entender que ele
continua sem redenção e que ela não pertence mais àquela realidade. Resta-lhe monologar consigo mesma, dar aulas de língua
portuguesa na universidade e ler romances como “Genetílides”, o livro que a
acompanha por toda a viagem, cujo enredo a faz intuir que a amiga está morta, o
que, afinal, não se confirma.
Além da trama costurada
pela protagonista, seduzem o leitor algumas reflexões metalinguísticas acerca
da semântica da palavra caatinga – que a personagem prefere pronunciar catinga,
- traçando um paralelo semântico com a palavra que dá título à obra – bodum –
que significa ‘odor almiscarado, cheiro nada agradável’. Muito sensorial, Gia
diz carregar o “cheiro de pneu queimado” nas narinas, como a dizer carregar
consigo a abundância de um passado desafortunado: a orfandade, a pobreza
sertaneja, a perda de um olho, o estupro e suas consequências, e a solidão.
Embora marcada por
tantos infortúnios, Bia é uma vencedora, pois saiu sozinha de sua
terra, enfrentou a discriminação, estudou e se fez professora universitária. É
o conhecimento a sua arma contra a ignorância e o seu bastão na luta pelo
“culto aos ancestrais e às crenças múltiplas que beneficiem a humanidade”,
despertando a consciência dos seus alunos para os problemas brasileiros e
estimulando mudanças. Ela parece gritar que o caminho para vencer a
desigualdade social é pela educação. O discurso de Gia é o da escritora, que
não se omite aos problemas sociais do seu país e mantém hasteada sua bandeira
de luta. Parabéns, Celma Prata, pela potência da sua fala na voz de sua
protagonista.
Aíla Sampaio
Que honra! Emocionada em ver Bodum nesta página maravilhosa! Obrigada! Beijos
ResponderExcluir