Devia ser domingo e ela estava engordando. Mas fez a pergunta fatal e ele saiu sem dar resposta. Tão só, sem filhos, sem amor, ela ficou à espera, tão sem, que o doce arredondava todas as vontades. Ele ia voltar, ela pensou no começo, e o tempo foi passando.
Esperança
parou de voar por perto, e ela foi se acostumando a não esperar, a viver porque
não poderia ser de outro jeito. Chorava mais quando ouvia “quanto sinto em
dizer-te...” O mais importante não era o verdadeiro amor, era viver cada dia e
mastigar o silêncio da casa, olhar a chave na porta no final do dia sem
enganchar na outra.
Quem
mandou pedir que ele decidisse? Quem? Ela se arrependeu, ligou pra ele, pior
não ficaria. Ele quase passando com a outra na sua calçada. Ela quis fingir que
não via porque, se visse, tinha que agir. Viu, agiu, se arrependeu. Não devia
ter ouvido conversa de vizinho. Nenhum sabe a hora do travesseiro como é, a
falta daquele pé roçando.
Ligou,
disse pra ele buscar o resto da roupa, falou do gás vazando, do chuveiro
esfriando. Que tinha se ele não saía mais com ela, não dormia lá? Pra que ouvir
conversa de vizinho? Ligou, pediu que ele fosse dar a extrema-unção, era a hora
final. Nem assim.
No dia seguinte,
uma coroa de rosas com laços violeta. Ele nem soube que ela não morreu. Nem a
viu mais gorda, só, tão sem como a deixara. Quem mandou pedir que ele
decidisse? Devia ser domingo, quando a solidão tornou-se eterna e irremediável.
Sem mais nem coroa nem laços violeta, ela parou de sofrer, redonda de tanto
doce. Ele nem soube...
Aíla
Sampaio